poetas vocais
Lume no horizonte, lume de sol agostino, sussurro pungente de arcos.
Um acorde maior com sétima maior se configura, faísca.
Abre-se o canal de meditação.
Um tunel do tempo.
A voz entoa um "alala" cósmico, seguida de outras vozes
que fazem tremeluzir a flama crepuscular.
Gratidão, solidão, "u a u", "u a u","u a u".
Tanger de cordas, tinir de cordas
Minimais, mínimas,
É a noite que rasga o ocaso e lhe toca a face,
Sorve o olor suave da matéria sonora,
Convida uma vez mais as Faustas
ao quintal da via láctea
Elas chegam sutis
a balbuciar sua cantilena mágica
O espaço valsa, conversa com elas
Em comoção varonil
E as faustas a lhe beijar o negrume
O frio contente de agosto
Invade as frestas, gela as pernas
Encolhe os ombros
Só resta aos mortais saltitar
Do horizonte da noite que nasce
Soam crotalos, cristianos.
A voz xamânica cricrila , a mão toca o tamborete
A voz abaritonada responde e chama
Duas vozes angélicas gorgolejam
A noite é toda bordadura e brilho chumbo.
No véu da membrana gélida
as cordas rasqueiam, pipilam,
uma ciranda de três marias dá voltas
Entram no rodopio a Ursa, Órion.
Vênus pisca longíncua, reunindo as circes
As sedas telúricas de seus penhoares
Perfumam cristais de neve.
Desfilam persongens de historia remota:
Desdêmona, presa ao iceberg, vê na crista da onda a proa do Argó
Não é Teseu, não é Perseu
É Jasão que vem, é Orfeu a sussurrar seus pensares
Da pedra feita oferenda, sonha a dama e espia as estrelas
Luuuuuu.... uuuuuuuuu...
De outro cume cisma Hamlet em seu nada fazer
Écuba, desolada, chora. Um coro de lágrimas,
Muito brancas...
Cascos salpicam o chão. Sirene.
Leve, sem susto, no seu glissando hipnótico
O tempo de meditar remete a outros ares na vigília enregelante
O mecanismo dos relógios marca repetições sem fim, de porvires
Devires longínquos, iiiiiiiiiiiiihhhhhhhhh.
Agora trotam cavaleiros de cruzadas agostinianas
São Arthures, Lancelots, Marcos, Alexandres, Grandes, de Olinda, Jorges, Miguel galgando montes, vales, depenhadeiros, cursos de rios, noite febril adentro na empunhadura do sabre
O frio que as cobertas não seguram
Que o fogo não aquece
amortece
E as Penélopes, Deméteres, Perséfones, Parsifae, Genevieves a uivar das galés,
O coração aos saltos, os lençóis sob os pés a farfalhar adeus
Nuvens diáfanas toldam as estrelas, o céu fica flics...
Entrando em nova dimensão,
dança a madrugada almiscarada,
o gato mia dentro dela seu lamento aterrado,
seu desdito alucinado
De frio, de fome, desesperança.
Princesa Zur, em algum canto deste céu, dorme, enquanto frotas de asas angélicas ciciam.
Um arremedo de aurora rutila no mesmo horizente anterior,
pontejado de estalactites.
O xamã anuncia o noticiário do futuro.
A Phenix e seus filhotes despertam ao primeiro lume.
O dia promete umidade e friagem,
sensação térmica abaixo de zero.
"Ua nai la la la ti o ú ú ú ururu.
Kio kio ti nana… tu tururu…"
De outro vértice,
os primeiros homens jogam seus embornais ao ombro
E seguem pelo campo,
não sem antes estar em genuflexão,
agradecendo a vida que vem.
Não virá o sol para aquecer os pastos hoje.
Não virá o mormaço para a preguiça do meio-dia
Não veio a geada.
Nas carpintarias o canto do serrote estridula.
A alma revoa, o corpo distrái, se torce em arrepio.
Deméter chora por Perséfone.
Hades, inflexível, comanda o inverno.
Orfeu canta à entrada do palácio trevoso.
Três da tarde, os tomates maduros quedam nas cestas, um a um
O pastor geme sua harmônica enquanto improvisa passos para lograr o frio.
As ovelhas, pasmadas, ruminam.
A paisagem tênue, tingida de filetes brancos,
Ecoa os córregos gelados.
Um jovem cruza de bicicleta.
Lume no horizonte, lume de sol agostino, sussurro pungente de arcos.
Nova noite sorri entredentes, sem estrelas, hoje gris.
As ninfas fecham seus casacos azul-petróleo.
Entra na cena diáfana a poeta Safo
que as convida à declamação.
Uma das atenas, madura, inicia a prédica sem palavras: "oe lala ree o, o nana na reo reo reo ree. É ti Éti, É É É... lasai na na nai na daí"
Um bordão reúne as energias galáticas
e o próprio Zeus recito um verso.
Afrodite lhe responde, malemolente.
O coro contemporiza, considera. Define.
Por um instante, o céu está limpo. Prata.
Mercúrio, de pés alados flutua de um lado a outro, em congratulações.
A música, assim disposta, em tons apolíneos,
Faz ressoar as mielinas dormentes.
Até os músculos desatentos das pernas gemem,
reconhecem o impulso de caminhar.
Assim reunidos, deuses, anjos, mulheres, cavaleiros, reis,
silentes na meditação
consolidam a divina arte da fruição,
enquanto Safo corrige os versos mancos desta poética de ouvir.
Entre um respiro e outro
Ouço o cantar mágico das sílfides,
Bom dia, bons dias, bons fluidos, larga jornada de ires e vires...
e são horas...
Canta, Safo, a coda final, o entrudo das tesmofórias.
*critica poética ao cd songs of ascension, Meredith Monk, 2006
Why am I I and you you?
Why is here not elsewhere,
Why does a period end a sentence
And would a sentence end otherwise
Or would it roll on endlessly,
Is it rolling on still?
Why does a pond ripple in a wind?
Why does a dog bark?
Why is music moving?
Why do I cry when someone’s
Kind for a moment
Even in a movie?
Why born, why die, why live another day,
Where come from, where going
Why and what for?
By Norman Fischer
para o amigo Gilson Hack, pelo seu aniversário
Comentários
Postar um comentário