Vértebra 3




C3 - Jabaquara (rio do senhor do voo) ou metáfora da Graça. 

 

Difícil achar a Coccoloba. Entrada na mata como estava, a trinca procurava abrigo para vários dias. Os seringueiros demarcaram um terreno difuso. Orun Tamõi entendia que ainda teria tempo antes de seguir para Chiribiquete. Apesar de leve, carregar mãe e filha todo tempo lhe punha desconforto às costas. Sem rezinga sequer a cunhanzinha, bicho ordeiro e sedoso, atento, parecia o ouvido da imensidade. Esse radar, encipoado aos peitos de Xaxim Verdadeiro, dava ao pajé leituras novas das coisas, das de fora e mais as de dentro. Byr, era assim que Orun Tamõi se dirigia à mãe, aprendeu mais na viagem pós parto que em toda a sua pequena existência. Byr era alma primeva. E já se fizera mãe, o que dava sentido ao esforço de compreender. Erguer-se, como ela queria erguer-se. Orun Tamõi apontara seus braços. Abrira a mão, um dedo por vez. Byr entendeu logo. Haveria de inventar outras formas de movimento. As pernas de Byr, inertes, assim forcadas dentro do balaio, mais um pouco e perderiam por completo o vigor. 

 

Foi Byr quem avistou, seguindo o olhar curioso de Isi’po, a imensa folha que tapava parte de Uraci. Acharam a árvore enfim, cumeeira de sol, de chuva, forro para o solo úmido. Orun Tamõi depositou o fado sobre uma pedra aplainada, engastada ao comprido na entrada da gruta e que possuía, embaixo, espaço para fazer fogo. O pajé preto se certificou, se havia moradores outros no belo reduto. Nem rastros, nem resíduos. Parecia um oratório esquecido, propício a quem se encontra em fuga. Ao mover-se, Orun Tamõi cuidava de não deixar vestígios, habilidoso que era com ibirapema. Atentava ainda mais agora. Sons, cheiros, ventos, luz. Emboscada nesse reduto representaria o fim de todo empenho. 

 

O chão era coberto do choro da mata. Tudo havia, que dava de comer à terra, aos troncos. Também havia o que se espera: répteis, anfíbios, aracnídeos e outras espécies do mundo visível. E do mundo invisível, outra história, para outro momento. Primeiro, firmar contrato. Aprender sintonia. Para a pequena família, encontrar comunidade. Simples conversa, sutis acordos. Poucos dias de arrio, o suficiente para reunir energia, disposição e sal. Entrariam sem nada no novo mundo, a compor com gente de quem nada sabiam.

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