Quase noite

Quase me surpreendo com a presteza das horas,
Com os acordos formados,
Com as vinte e cinco milhões de ondas tocando as refinarias de petróleo
Que se erguem no meio do mar.
Quase me impressiono com a história dos homens.
Quase me envergonho dela.
Porque às vezes penso que somos feios, mal acabados,
Um desacordo com o que é natural.
O que é que somos, Santo Antonio?
O que podemos nós esperar de toda História?
Calma, me diz um suspiro quando é quase noite.
Soube que muitos temem
Essa hora em que o céu mostra o sol
Como se um celofane laranja o cobrisse.
A hora em que é possível olhar a bola quente
E avistar Ícaro voando longe.
Quase me surpreendo com a delícia das horas,
Com as palavras impressas,
Com toda água suja que se move
Quando o homem vai furar o fundo do oceano.
Quase me alimento com a história dos homens.
Quase me envergonho dela.
Porque às vezes sinto que sou feia, mal acabada,
Um desacordo com o que é natural.
O que é que eu sou, Santo Antonio?
O que posso esperar para minha história?
Espero poder ler, em Lisboa, olhando o Tejo,
Cartas Portuguesas.
Espero que um homem bom me dê livros.
Espero esse dia lisboeta chegar
Como espero a volta do verão.
Quase noite, quase triste porque vem a noite
Vejo a fumaça que risca o céu na rabeira de um jato.
Ali está lá escrito: calma.
Aleluia.
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