Corpo oficina sonora

pés e mãos
passo, arrasto, bate estaca, salto com um, com dois, exploro timbres, alturas, durações, amplitude, velocidade, pulsos, células, frases lineares, frases combinadas...
estalar, esfregar, dedos no pulso, palma com palma, dedos na palma, dedos nos dedos, pulsos, células. frases lineares, frases combinadas
mãos na coxa, mãos no peito
embalo, cirandeio, chuto e bato pé e bato palma
combino tudo
escultura, boneco de pano, marionetes
serpente, trem, monstro marinho, máquina
termino no passo e ponho voz...

*ilustração de Ivan Zigg


Andava pela estrada, sozinho. Um sol de rachar e os dois andando, sem parar. E andando, resolvidos, iam os três desenxabidos.

Os quatro não andavam à toa: buscavam uma terra boa.

Com os pés doendo de tanto andar, os cinco pararam para descansar.

E os seis se deitaram, dormiram, sonharam...

No meio da noite, os sete acordaram e se arrepiaram.

Dezesseis olhos arregalados, brilhando, viram o rio iluminado, o chão iluminando.

Cavando a terra, dezoito mãos traziam, com a respiração ofegante, dezenas de pedrinhas brilhantes.

Depois de muito cavar, contar e reunir, os dez começaram a discutir.

O centro da discussão era este: onze andarilhos podem suportar tantos brilhos?

Uma dúzia de idéias diferentes, uma ou outra interessante, mas nenhuma idéia brilhante.

Com as palavras doendo de tanto falar, os treze resolveram si-len-ci-ar.

Deitados, silenciosos, os catorze buscavam uma nova rima, quando olharam para cima...

Boquiabertos, ao som de quinze admirações, descobriram estrelas candentes, candentes em grandes porções e proporções.

E aquelas dezesseis imaginações tropeçaram nas mesmas conclusões...

"As pedras são farelos de estrelas", dezessete vezes pensaram e dezessete vozes exclamaram.

E declararam os dezoito andarilhos, acostumados a vagar de déu em déu: "Essa terra tem parentesco com o céu".

E dezenove caminheiros decidiram fincar o pé e se estabelecer: "De agora em diante, aqui vamos morar, aqui vamos viver".

Vinte vezes festejaram, quando uma voz desfestejou: "Continuarei caminhando. Adeus. Já vou".

E deste que se foi, ligeirinho!, posso dizer apenas que ele.

Andava pela estrada, sozinho.
Prosa poética de Francisco Marques (Chico dos Bonecos)
novaescola@atleitor.com.br

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